Marianna Crioula foi uma mulher de grande expressividade no âmbito da insurreição de 1838, lutando bravamente e resistindo nesse período de intensas adversidades.
Uma fuga de centenas de escravizados ocorrida em Vassouras e Paty do Alferes em 1838 foi um acontecimento histórico marcante no Vale do Café do século XIX. Estimularia um certo reordenamento na forma como eram tratados os escravizados pela classe senhorial da época e menos de uma década depois serviria de inspiração para a elaboração de um manual com instruções para os fazendeiros de café lidarem com seus plantéis, aconselhando os senhores a não forçarem tanto a barra e fazer certas “concessões”. Afinal, preto que podia ter sua roça e fazer festa de vez em quando, não teria tempo para se organizar em fugas e se revoltar contra seu senhor. Era essa a mentalidade dos fazendeiros de café no Vale do Paraíba do Brasil imperial, principalmente após esse evento da fuga que ficou conhecido como a “Insurreição de Manuel Congo”.
Na noite de 6 de novembro de 1838, um grupo de escravizados pertencentes ao capitão-mór Manuel Francisco Xavier fugiu de forma coordenada e previamente organizada de três de suas propriedades, o sítio de Encantos e as Fazendas Freguesia e Maravilha. O grupo partiu da Fazenda Freguesia e seguiu em direção à Maravilha, onde houve arrombamento da casa sede. Lá retiraram mantimentos, ferramentas, armas e seguiu em mais de 300 para as matas da Fazenda Santa Catarina. Há evidências de que eram liderados por Manuel Congo, João Angola, Epifânio Moçambique e Marianna Crioula.
Alguns indícios apontam que o estopim para a fuga teria sido a morte por assassinato do escravo Camilo Sapateiro na Fazenda Freguesia pelos jagunços do capitão-mór e a completa indiferença do senhor que não tomou qualquer providência em relação a esse fato, que gerou medo entre os escravizados.
Manuel Congo, apesar de ter sido enforcado em praça pública em 6 de setembro de 1839 por conta da fuga e do assassínio de dois pedestres integrantes da milícia formada para sufocar a rebelião e de ter seu nome marcado na história por causa dela, não foi o único herói desse acontecimento. A insurreição contou com o protagonismo direto de uma escravizada chamada Marianna Crioula, historicamente menos conhecida que Manuel Congo (hoje talvez nem tanto), mas tão importante quanto ele no contexto geral da insurreição.
O nome de Marianna ficou por muito tempo apagado na história. Surgiu com mais força no final dos anos 90 e nos últimos vinte anos passou a figurar mais nitidamente na memória e no imaginário da região. Nesse período houve uma considerável quantidade de referências à Marianna. Cresceu o número de ações, eventos, reportagens e outros projetos que trouxeram à tona o nome da escravizada. Filmes, documentários, vídeos no youtube, encenações teatrais, postagens, nomes de sala, creche, maternidade, ONG e outras ações em torno do nome dela. Não se trata de um movimento orquestrado, ou pensado em torno de alguma ocasião especial. Mas são ações que revelam a importância de Marianna Crioula e a importância de evidenciar sua história tão inspiradora. E ela merece cada uma das homenagens, menções e referências.
A história de Marianna Crioula está intrinsecamente entranhada na história de Manuel Congo e na história da insurreição de 1838. Marianna é apontada como uma das líderes da rebelião ao lado de Manuel Congo e em alguns casos mencionada erroneamente como companheira (esposa) dele. O fato é que Marianna teve seu próprio protagonismo na insurreição e embora não tenha sido condenada à morte como Manuel Congo passou à história como uma figura de luta e de resistência, alguém que foi fundamental no processo de fuga e resistência na insurreição de 1838.